domingo, 27 de fevereiro de 2011

Esse Panamericano... - Correcao Monetaria, Etica, Baixar Inflacao por Decreto

Comments

Caros,
Sou Contador, e compreendi perfeitamente a mensagem do Mestre Kanitz, mas vamos parar de brincar de ser Contador.
Os operadores da contabilidade, sempre se curvaram ao que os gestores desejavam, la (EUA) para garantir um lucro, seja para atrair o acionistas, seja para remunerar o gestor, pois os bonus sao calculados em cima do resultado (regra geral).
Nunca entendi de fato qual a funcao de um economista, pois se e possivel baixar a inflacao por decreto, como foi feito na era Collor, tudo entao eh possivel, rasguem-se os livros que estudamos na faculdade, pois tudo gira em torno da Politica, dos interesses de grupos economicos.
E impossivel aceitar que nao se possa fazer a correcao monetaria, aquela aplicada ate 31 12 1995, como posso deixar de atualizar o PL e extinto Ativo Permanente, se ha inflacao de 5, 6% ao ano ela deve ser reconhecida nas demonstracoes contabeis, nao importa se as DFs sao estaticas.
Cansei de ouvir dizer que a contabilidade nao serve para nada, pois quando se analisa um balanco, os fatos ja aconteceram, verdade ja aconteceram, mas quer que continue acontecendo as mesmas coisas, o mesmo prejuizo, entao nao faca nada, ou use esta poderosa ferramente e faca algo para as proximas demonstracoes nao serem iguais as anteriores, logico se estas anteriores te desagradam.
Nao estou falando aqui de demonstracoes a exemplo do Itau, Banco do Brasil e Bradesco por exemplo, estas que bom quero que continuem dando os lucros que vem dando ha muitos anos.
Bom, enfim falaram em fair value, reflexo da mais recente norma IFRS, ja chegou tarde eh logico que temos que reconhecer os numeros com base no fair value, do contrario continuaremos atrasado no mundo contabil, isto fez com que a contabilidade fosse elevada ao nivel de uma profissao nobre, entre outras coisas que aconteceram com a Lei 11.638/2007 que ficou por mais de 10 anos estacionada no Congresso, muitos interesses conflitantes.
Enfim nao abandono a contabilidade porque acredito nesta ciencia, que alguns pensam que sao ciencias exatas, e nao sao, pois sao ciencias humanas, por isso o balanco pode dar o que voce quer que de, logo 1 + 1, nao necessariamente eh 2, eu provisiono o quanto eu quero, melhor dizendo da forma que eu interpretar a favor do meu cliente (etica), ah etica eh outro assunto, quem deve entender deve ser os controladores do Panamericano, da Parmalat, da Worlcom, da Enron, do Banco Santos, do Banestado, do Bamerindus, do Banco Nacional, da Tyco, do Banco Economico, da Encol, etc.
Claudionei Santa Lucia
claudionei.santalucia@gmail.com
www.csl.cnt.br
www.contabilidadecsl.blogspot.com
Paulo Honda said...
Tudo isso ai está certo. Mas avisaram os "russos"?...
fernando said...
isso trata-se pelo fato do Balanço Patrimonial ser um demonstração estática, é um corte no tempo. como a CPC 00 fala e se tratar de uma demonstração contábil, e nao financeira. Diferentemente da Demonstração do Resultado, q é dinâmica e sofre todo impacto do mercado, como inflação, etc.
A Reavaliação de ativos, foi extinta e mt bem extinta como toda ferramenta que o brasileiro usa pra se beneficiar ao extremo - vide o metodo de compra de roupas americano, por exemplo se fosse aqui implantado seria um caos.
O fim da correção se dá nao pelo controle da economia, mas pelo controle contábil, pois como todos sabem. Todos os anos se corrigiam os valores dos ativos da empresa buscando o ''valor real'' assim sempre proporcionaria um lucro maior que o real.
Exemplo pratico disso seria uma empresa compra um carro por 10 mil, no antigo metodo de depreciação(pela tabela da receita)esse carro depreciaria 20% ao ano. ou seja ao fim do ano este carro 'valeria' 8.000 mas os empresarios, visando um lucro maior corrigem o valor do carro para 9.000 ou seja essa diferença de 1.000 em sintese passa pelo Patrimonio liquido da empresa e vai para o seu resultado, aumentando o lucro, etc. de tanto abusada essa pratica foi proibida no brasil.
Assim com a busca do 'fair value' na contabilidade tende a sanar esses problemas.
EDUARDO J. DI PIETRO said...
EXPLICAÇAO DE MESTRE, QUE VC DE FATO é !!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Sandro Chequer said...
Para os que não sabem, O prof. Kanitz também é contador. Se assim o fosse não poderia ter explicado melhor. O fruto de sua tese de doutorado na USP até hoje é citada em vários livros sobre análise de balanços. Todo contador entendeu o que ele disse neste post! Agora, quem não é do ramo das ciências contábeis, e quiser saber mais sobre o assunto, realmente deve procurar um contador para que melhor seja apresentado o tema. Vale destacar algo interessante. A Lei citada que vedou a correção monetária foi a Lei n º 9.249/95, que alterava a legislação do IR. Porém a Lei das S/A, com as recentes alterações, determina que as S/A sigam as normas contábeis emandas da CVM. A CVM por sua vez validou as IFRS, traduzidas pelo CPC, e estas normas internacionais não vedam a correção monetária. Logo, as S/A de capital aberto e empresas de grande porte "podem fazer a correção monetária"?? Com a palavra os especialistas no assunto.
Luiz said...
Compartilho com o colega Carlos, exemplo numérico poderia eclarecer
João Pedro said...
Tampouco o patrimônio pessoal declarado no IRPF reflete a realidade.
A receita federal proibe a correção do valor dos bens adquiridos a partir de 1996.
Ou seja se voce comprou um apartamento em 1996 e for vendê-lo em 2011 você pagará imposto sobre a diferença entre o valor pago na aquisição (1996) e o valor de venda (2011), pois a receita entende que houve um ganho de capital.
Quinze anos de inflação e isto é chamado de ganho de capital.
Carlos said...
Sthephen,
Essa sua análise é muito interessante.
Você poderia dar um exemplo mais didático? Um exemplo numérico mesmo.
Compreendi a mensagem mas não entendi operacionamente como isso possui tal impacto.
Abraços!

domingo, 13 de fevereiro de 2011

FRAUDES CONTABEIS X ACADEMIA X ORGAOS REGULADORES

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http://www.contabeis.com.br/artigos/284/existe-remedio-contra-fraudes-erros-e-desvios-contabeis-financeiros/



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CVM x Banco Economico

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05/12/2001 - 20h15

Veja a íntegra da decisão da CVM que pune o ex-dono do Econômico


da Folha Online

Veja a íntegra do inquérito que envolve o ex-dono do Econômico, Ângelo Calmon de Sá.


"INQUÉRITO ADMINISTRATIVO CVM N.º 08/98

INTERESSADOS: ÂNGELO CALMON DE SÁ E OUTROS

RELATOR: DIRETOR WLADIMIR CASTELO BRANCO CASTRO

RELATÓRIO DO RELATOR

1. O Inquérito Administrativo em epígrafe foi instaurado para "apurar a possível ocorrência de irregularidades na escrituração contábil e na gestão dos negócios de Econômico S/A Empreendimentos".

I. Da Origem do Inquérito


2. O Banco Central do Brasil, em ofício enviado à CVM, datado de 19 de maio de 1997, informou ter verificado, no Inquérito por ele instaurado em virtude da decretação de intervenção na Econômico S/A Empreendimentos, que a escrituração da intervinda não exprimia a real situação de seu patrimônio, como determina o artigo 176 da Lei n.º 6.404/76, bem como a ocorrência de ato de liberalidade, em afronta ao disposto no artigo 154, parágrafo 2.º, da mesma Lei (fls. 015 a 017).


3. A Comissão encarregada da condução do inquérito perante o Banco Central detectou diversos créditos consignados no relatório contábil, data-base de 7 de fevereiro de 1996, sem instrumentos jurídicos que comprovassem sua existência, além da referência a imóveis cujo valor contábil era infinitamente inferior (sic) ao valor de mercado apurado pela própria intervinda.


4. Foi apurado, ainda, que a Econômico S/A Empreendimentos funcionava como centralizadora do sistema de caixa único, prestando socorro às empresas ligadas deficitárias, com recursos recebidos de ligadas superavitárias, o que poderia ter facilitado a transferência de resultados entre as empresas do Grupo.


5. Em 23 de junho de 1997, a Gerência de Acompanhamento de Empresas-2 propôs a instauração de inquérito administrativo (fls. 002 a 004), em razão de possível infração aos artigos 153, 154, caput e parágrafo 2.º, alínea "a", e 176, da Lei n.º 6.404/76, por parte dos seguintes administradores da Econômico S/A Empreendimentos:



Sr. Ângelo Calmon de Sá, Presidente do Conselho de Administração;


Sr. Rivaldo Gomes Guimarães, Vice-Presidente do Conselho de Administração e Diretor;


Sr. Antônio Calmon Du Pin e Almeida, membro do Conselho de Administração;


Sr. Francisco de Sá Júnior, membro do Conselho de Administração;


Sr. José de Sá Neto, membro do Conselho de Administração e Diretor;


Sr. Jorge Lins Freire, membro do Conselho de Administração; e,


Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz, Diretor.


6. O Diretor-Relator à época aprovou a proposta de abertura de inquérito apresentada pela área técnica, acrescentando que, em relação aos acionistas controladores, deveria ser investigado eventual abuso de poder, na modalidade definida no artigo 117, parágrafo 1.º, alínea "a", da Lei Societária (fl. 005). O Colegiado da CVM, em reunião de 3 de setembro de 1997, acompanhou, na íntegra, o voto do Diretor-Relator (fls. 006 e 007).


7. As pessoas às quais foram atribuídas responsabilidades foram notificadas da abertura do Inquérito (fls. 008 a 014).


8. Em ofício datado de 13 de janeiro de 1998, o Banco Central informou à CVM ter apurado, no Processo Administrativo referente a Econômico S/A Empreendimentos, indícios da prática da infração ao disposto no artigo 30 da Lei n.º 6.404/76, em razão do gravame incidente sobre ações de emissão da CONEPAR - Companhia Nordeste de Participações em seu próprio favor (fl. 088).


9. A Comissão designada pela PORTARIA/CVM/PTE/N.º062/98 (fl. 01), alterada pela PORTARIA/CVM/PTE/N.º047/99 (fl. 310), para a condução do presente Inquérito, concluída a fase de instrução, apresentou o seu Relatório.


II. DOS FATOS


10. Foram analisados, pela Comissão de Inquérito, em seu Relatório (fls. 877 a 891), os seguintes fatos, abaixo expostos sucintamente.



Créditos referentes a juros


11. Os documentos de fls. 18 a 26 e 444 a 538 especificam créditos relativos a parcelas vencidas de juros, referentes a Cédulas de Crédito Industrial e Cédulas Rurais Hipotecárias, emitidas por usinas de açúcar e álcool, em favor do Banco Econômico S/A, as quais foram pagas pela CST Empreendimentos e Participações Santana do Parnaíba Ltda. e a ela endossadas pelo Banco Econômico S/A. Tais créditos, conforme balancete da CST Empreendimentos, referente ao mês de dezembro de 1995, somam R$ 11.441.587,54 (onze milhões, quatrocentos e quarenta e um mil, quinhentos e oitenta e sete reais e cinqüenta e quatro centavos, fls. 373 e 374).


12. A CST Empreendimentos tinha 99,99% de suas cotas pertencentes à Agropecuária Senhor do Bonfim Ltda. (fl. 385), a qual tinha 99,99% de suas cotas pertencentes à Econômico Agro Pastoril Industrial S/A (fl. 384), que, por sua vez, era controlada pela Econômico S/A Empreendimentos (fl. 383). Esta era controlada pelo Banco Econômico S/A. (fl. 381).

13. O Sr. Gileno Afonso, controller da Econômico S/A Empreendimentos, informou aos inspetores da CVM, por ocasião da inspeção realizada na Econômico S/A Empreendimentos (fls. 314 a 329), que os créditos mencionados estavam contabilizados no Banco Econômico S/A como "Créditos em Liquidação" e foram transferidos para que o Banco pudesse "limpar" seu balanço e se enquadrar nos limites operacionais fixados pelo Banco Central.


14. Segundo a Comissão de Inquérito, a troca de ativos entre o Banco Econômico e a CST Empreendimentos "serviu para mascarar a situação do Banco, pois os créditos em liquidação, que deveriam ser contabilizados como prejuízo, foram transferidos para a controlada indireta como ativos bons, o que contraria o prescrito no artigo 176 da Lei n.º 6.404/76 e ilude o mercado acionário, no que tange à decisão de comprar, vender ou reter títulos do Banco".



Créditos da CST Consultoria e Vendas Ltda.


15. A CST Consultoria e Vendas Ltda., da mesma forma que a CST Empreendimentos, tinha 99,99% de seu capital em poder da Agropecuária Senhor do Bonfim Ltda. (fl. 386).


16. Os créditos em questão foram transferidos da Promotora Econômico Consultoria e Vendas Ltda., controlada da Econômico S/A Distribuidora (fl. 388), para a CST Consultoria e Vendas Ltda. e somam R$ 33.952.205,29 (trinta e três milhões, novecentos e cinqüenta e dois mil, duzentos e cinco reais e vinte e nove centavos), conforme "Instrumento Particular de Cessão de Direitos", de 30 de dezembro de 1994 (fls. 539 e 540).


17. Conforme consta do Relatório, tais créditos, em 31 de dezembro de 1995, valiam R$ 42.514.645,57 (quarenta e dois milhões, quinhentos e quatorze mil, seiscentos e quarenta e cinco reais e cinqüenta e sete centavos, fls. 541 a 553) e também estavam contabilizados no Banco Econômico S/A como "Créditos em Liquidação". Foram transferidos inicialmente para a Promotora Econômico Consultoria e Vendas Ltda. e , posteriormente, para a CST Consultoria e Vendas Ltda.. Segundo o Sr. Gileno, o objetivo seria também "limpar" o balanço do Banco Econômico S/A (fl. 320).



Imóveis em Brasília e Salvador


18. Conforme consta do Ofício DESAL/REJUR-97/223 do Banco Central (fls. 015 a 017) e anexos (fls. 073 e 074), estariam contabilizados no ativo da Econômico S/A Empreendimentos um terreno localizado em Brasília e outro localizado em Salvador, os quais não pertenceriam àquela empresa e teriam sido expurgados pelo Banco Central.


19. A Comissão de Inquérito, em seu Relatório, afirmou discordar do Banco Central quanto à propriedade do terreno localizado em Salvador, no Morro do Gavazza, uma vez que, embora o terreno estivesse registrado com o mesmo número de matrícula de um apartamento pertencente à Sra. Angélica Rangel Gonçalves (fl. 836), a certidão de fls. 418 e 419 e o documento de fls. 420 a 423 referem-se ao imóvel como "área remanescente do Morro do Gavazza".


20. No que diz respeito ao terreno localizado em Brasília, a CST Expansão Urbana S/A adquiriu 47,37% do imóvel, pertencente à Fundação Econômico Miguel Calmon, conforme "Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda", de fls. 414 a 417. Este imóvel foi vendido para a Econômico S/A Empreendimentos (fl. 756 a 759), que o revendeu para a Econômico Agro Pastoril Industrial S/A (fls. 425 a 431).


21. Segundo o Relatório, a relação dos ajustes feitos pelo Banco Central na Econômico S/A Empreendimentos mostra que, contrariamente à Comissão de Inquérito daquela Autarquia, o Interventor aceitou os instrumentos particulares de transferências de propriedade do terreno de Brasília e constatou a propriedade do terreno do Morro do Gavazza (fl. 431).



Imóveis contabilizados por valor muito superior ao de mercado


22. O Relatório da Comissão de Inquérito apontou, ainda, vários imóveis que, contrariamente ao disposto no ofício do Banco Central de fls. 015 a 017, foram contabilizados por valor muito superior ao de mercado (fls. 073 a 080 e 883 e 884).


23. As análises da Comissão de Inquérito do Banco Central (fls. 073 a 080) e os ajustes realizados pelo Interventor na conta "Imóveis Urbanos/Rurais" (fl. 431) mostrariam que os imóveis foram superavaliados. Segundo levantamento efetuado pelo Interventor, os imóveis estariam superavaliados em R$ 23.590.167,85 (vinte e três milhões, quinhentos e noventa mil, cento e sessenta e sete reais e oitenta e cinco centavos).


24. Segundo o Relatório da Comissão de Inquérito da CVM, os créditos em liquidação que se transformaram em ativos bons, os débitos e créditos resultantes do sistema de caixa único e os imóveis superavaliados mostrariam que a contabilidade da Econômico S/A Empreendimentos seria obra de ficção (fl. 884).



Compra de ações de emissão da USIMINAS


25. Em 28 de abril de 1995, a Econômico S/A Empreendimentos comprou, em negociação privada, 67.667.016.470 (sessenta e sete bilhões, seiscentas e sessenta e sete milhões, dezesseis mil e quatrocentas e setenta) ações ordinárias nominativas de emissão da Usina Siderúrgica de Minas Gerais - Usiminas, pagando à vendedora, sua ligada, Econômico Agro Pastoril Industrial S/A, R$ 1,85 por lote de mil ações, totalizando R$124.978.555,08 (cento e vinte e quatro milhões, novecentos e setenta e oito mil, quinhentos e cinqüenta e cinco reais e oito centavos, fls. 085 e 086).


26. Foi verificado pela Comissão de Inquérito, a partir das listagens dos negócios realizados na Bovespa (fls. 853 a 861) e na BVRJ (fls. 862 a 867), que aquelas ações possuíam reduzidíssima liquidez em 1995 e, embora as operações em datas próximas à da negociação privada da Econômico S/A Empreendimentos com a Econômico Agro Pastoril Industrial S/A, realizada em 28 de abril de 1995, tenham sido efetuadas a R$ 1,30 e a R$ 1,40, entendeu a Comissão que os preços praticados foram compatíveis com a importância do lote, equivalente a 6,1% do capital votante da companhia (fl. 868).



Gravame incidente sobre as ações da CONEPAR em favor da própria Companhia


27. Em contrato de mútuo firmado entre a CONEPAR, como mutuante, e Econômico S/A Empreendimentos, como mutuária (fls. 165 a 170), esta, em garantia de dívida com a primeira, caucionou, em favor da mutuante, 1.000.000.000 (hum bilhão) de ações de emissão da própria CONEPAR, em infração ao disposto no artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76.



Atuação da AUDIN Auditores Independentes S/C


28. A inspeção realizada pela fiscalização da CVM, apurou, em relação à auditoria realizada pela Audin Auditores Independentes S/C, nas demonstrações financeiras da Econômico S/A Empreendimentos, relativas ao exercício social findo em 31 de dezembro de 1995, as seguintes infrações às Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC):



a carta proposta (fls. 611 e 612) não menciona o número de horas estimadas para a realização dos serviços; não menciona, ainda, que o trabalho seria efetuado segundo as Normas Brasileiras de Contabilidade, nem a qualificação profissional da equipe técnica a ser utilizada na realização dos serviços, descumprindo o disposto no item 1.4.2, alíneas "b", "c" e "f", da NBC P-1;


inexistência de memorando de planejamento e de programa de trabalho, contrariando o disposto no item 11.2.1.4, da NBC T-11;


inexistência de relatório com avaliação do sistema contábil e de controles internos, contrariando o disposto no item 11.2.5.3, da NBC T-11;


inexistência de evidência de que os procedimentos de auditoria foram aplicados, conforme determina o item 11.2.6, da NBC T-11; e,


os papéis de trabalho (fls. 592 a 610) não evidenciaram que a auditoria foi realizada de acordo com as normas vigentes, não possuindo datas, assinaturas, conclusões e referências cruzadas para documentos obtidos na empresa.


29. Na publicação das demonstrações financeiras da Econômico S/A Empreendimentos, de 31 de dezembro de 1995, incluindo o Parecer dos Auditores Independentes, datado de 26 de julho de 1996, no "Correio da Bahia", não foram publicadas as notas explicativas de n.º 11 a n.º 15 e tal fato não foi informado à CVM pela Audin, tendo sido infringido o disposto no artigo 29, item VII, da Instrução CVM n.º 216/94.


30. Ademais, a Audin, no Parecer por ela elaborado, não fez qualquer menção ao fato de as operações com sociedades controladas/coligadas não estarem suportadas por contratos de mútuo, como fizera no "Relatório de Auditoria" (fls. 615 e 616), tendo, inclusive, afirmado que os principais saldos estavam suportados por contratos. Afirmou, ainda, que a revisão das demonstrações financeiras da controlada Econômico Agro Pastoril e de algumas de suas investidas não incluíram todos os procedimentos requeridos pelas normas de auditoria, porém não esclareceu os motivos (fl. 367).


31. Diante do exposto, concluiu a Comissão de Inquérito, em seu Relatório, pela responsabilização das seguintes pessoas:


a) por infração ao disposto nos artigos 176, caput, e 153 da Lei n.º 6.404/76, aos seguintes administradores da Econômico S/A Empreendimentos à época dos fatos:



Sr. Ângelo Calmon de Sá, Presidente do Conselho de Administração;


Sr. Rivaldo Gomes Guimarães, Vice-Presidente do Conselho de Administração e Diretor;


Sr. Antônio Calmon Du Pin e Almeida, membro do Conselho de Administração;


Sr. Francisco de Sá Júnior, membro do Conselho de Administração;


Sr. José de Sá Neto, membro do Conselho de Administração e Diretor;


Sr. Jorge Lins Freire, membro do Conselho de Administração; e,


Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz, Diretor;


Sr. Alberto Martins Catharino, Diretor; e,


Sr. Lafaiete Coutinho Torres, Diretor.


b)por infração ao disposto no artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76, aos seguintes Diretores da Econômico S/A Empreendimentos e da CONEPAR:



Sr. Alberto Martins Catharino, Diretor da Econômico S/A Empreendimentos;


Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz, Diretor da Econômico S/A Empreendimentos;


Sr. Antônio Cesar Sá Leitão, Diretor da CONEPAR; e,


Sr. Renato Ferreira de Abreu Castro, Diretor da CONEPAR.


c) por infração aos artigos 25 e 29, incisos III e VII, da Instrução CVM n.º 216/94:



Audin Auditores Independentes S/C; e;


Sr. Airton Cardoso Moura, responsável técnico.


32. Finalmente, foi sugerido envio do Relatório ao Ministério Público e ao Conselho Regional de Contabilidade da Bahia.


33. O Colegiado da CVM, em reunião datada de 30 de junho de 2000, acompanhando o voto do Diretor-Relator, aprovou o Relatório da Comissão de Inquérito (fls. 897 e 898).


34. Os interessados foram intimados a apresentarem suas defesas (fls. 905 a 917, 922 e 1.033).


III. Das Defesas


35. Os acusados, em suas defesas tempestivamente interpostas, alegaram, em síntese, o disposto a seguir.


III.a. Defesa do Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz


36. Alegou o Defendente (fls. 940 a 942), inicialmente, que não lhe foram assegurados o contraditório e a ampla defesa, o que geraria a nulidade do Inquérito.


37. Alegou, ainda, que "a Econômico S/A Empreendimentos constituíra-se e se mantivera como uma sociedade componente do grupo Econômico, cujo capital social é integralizado por seu controlador, outras sociedades e pequenos acionistas coligados, jamais havendo negociado suas ações em bolsa ou no mercado de balcão", razão pela qual não poderia ser enquadrada nas atividades subordinadas ao regime da Lei n.º 6.385/76.


38. No mérito, alegou o Defendente que não poderia ser responsabilizado pelas irregularidades apontadas na elaboração das demonstrações financeiras, relativas ao exercício social findo em 31 de dezembro de 1995, porquanto, naquele exercício, a Econômico S/A Empreendimentos encontrava-se sob a administração gerencial e patrimonial do Banco Central.


39. O contrato de mútuo celebrado entre a CONEPAR e a Econômico S/A Empreendimentos não contrariou o artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei Societária, uma vez que tal dispositivo deve ser interpretado em consonância com o artigo 265 da mesma Lei e, em segundo lugar, porque a Econômico não recebera suas próprias ações em garantia, mas ações do capital da CONEPAR.


40. Assim, se infração houvesse, não a teria cometido o Defendente, que representava a parte tomadora do empréstimo.


41. Ademais, o contrato foi celebrado em 27 de dezembro de 1989 e já teria ocorrido a prescrição, posto ter decorrido mais de dez anos daquele fato.


42. Dada a falta de culpa e dolo por parte do Defendente, requereu ele a sua exclusão do rol dos indiciados no presente Inquérito, da mesma forma que fizera o Ministério Público Federal, no Inquérito n.º 1.072/98.


III.b. Defesa do Sr. Airton Cardoso Moura


43. O Sr. Airton Cardoso Moura alegou (fls. 967 a 969) que foi contratado pelo Interventor da Econômico S/A Empreendimentos, uma vez que esta, por ser controlada do Banco Econômico S/A, estava também sob intervenção.


44. Afirmou ter procedido aos exames sobre as demonstrações financeiras daquela empresa de acordo com os princípios e as normas contábeis em vigor, além de ter prestado ao Banco Central todas as informações relevantes.


45. Com relação às notas explicativas não publicadas, informou ter procedido à entrega do Parecer dos Auditores Independentes, acompanhado de todas as demonstrações financeiras (completas), cuja cópia a CVM recebeu através das Demonstrações Financeiras Padronizadas, de 31 de dezembro de 1995, não sabendo esclarecer os motivos pelos quais a companhia não publicou as referidas notas explicativas.


46. No que diz respeito às operações financeiras com controladas e coligadas, informou que, como estas ocorriam com freqüência, era utilizado o sistema de caixa único, o qual foi avaliado pelo Banco Central, que nada constatou de irregular nos seus registros.


47. Quanto aos adiantamentos repassados às coligadas e controladas, afirmou o Defendente que eram para atender às despesas operacionais das mesmas e não tinham conotação de empréstimo. Os valores foram registrados e corrigidos, tanto na controladora quanto nas controladas e coligadas, em igual valor.


48. Solicitou o Defendente o arquivamento do presente Inquérito, posto não ter havido qualquer irregularidade cometida pela Audin Auditores Independentes S/C no desenvolvimento de seus trabalhos.


III.c. Defesa do Sr. Antônio César de Sá Leitão


49. Com relação ao fato de ter assinado o contrato de mútuo, que estabeleceu o gravame sobre as ações da CONEPAR em favor dela própria, alegou o Defendente (fls. 1.037 a 1.041) desconhecer a proibição constante do artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76 e ter assinado o contrato de boa-fé. Afirmou ter sido informado de que a operação de mútuo fora aprovada pelo Conselho de Administração, não tendo participado da deliberação, nem tido conhecimento da existência de ata de reunião do Conselho que tivesse formalmente aprovado tal operação. Não sabia que a garantia consistiria em ações da própria empresa e assinou o contrato em razão de o Diretor-Presidente encontrar-se em férias natalinas.


50. Afirmou que antes da renovação do referido contrato já não se encontrava mais na CONEPAR. Embora estatutariamente fosse Diretor daquela companhia, estava dirigindo uma empresa coligada. E, antes da segunda renovação do contrato de mútuo, já não fazia mais parte da Diretoria da Sociedade (sic). Os dois aditivos de renovação teriam sido assinados pelo Diretor-Presidente e o Sr. Renato Ferreira de Abreu Castro, Diretor de Relações com o Mercado, teria sido o signatário da caução a favor da CONEPAR no Livro de Registro de Ações da companhia.


51. O Defendente alegou que não teve conhecimento de ter havido perdas ou prejuízos para os acionistas, diretores ou empregados da sociedade, tampouco para seu objeto social.


52. Por não ter tido participação efetiva na concepção, negociação e tampouco na aprovação do contrato de mútuo, requereu o Sr. Antônio Leitão a sua exclusão do presente Inquérito.


III.d. Defesa dos Srs. Ângelo Calmon de Sá, Francisco Sá Júnior, Antônio Calmon Du Pin e Almeida, Rivaldo Gomes Guimarães, Renato Ferreira de Abreu Castro e José de Sá Neto (fl. 1.130)


53. Requereram os Defendentes (fls. 1.096 a 1.129), preliminarmente, o desmembramento do presente Inquérito, uma vez que não haveria, entre as acusações, conexão, continência ou qualquer laço material, relação de causalidade ou imputabilidade, tendo sido atribuída, ao Sr. Renato Ferreira de Abreu Castro infração ao artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76 e, aos demais Defendentes, infração aos artigos 176, caput, e 153 da mesma Lei.


54. A manutenção do presente Inquérito como um só dificultaria a defesa, levando à sua nulidade, em face da violação aos artigos 103 e 104 do Código de Processo Civil, aos artigos 76 e 77 do Código de Processo Penal e artigo 5.º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal.


55. Alegaram os Defendentes, ainda, que o presente Inquérito sustenta-se nos elementos colhidos pelo Banco Central, no curso do inquérito por este instaurado após a decretação de intervenção na Econômico S/A Empreendimentos.


56. A CVM não teria competência para examinar atos praticados e verificados pelo Banco Central, assim como este não teria ingerência nas matérias cometidas por lei à CVM. Assim sendo, os documentos que integram o ofício de fls. 15/852 não constituiriam provas eficazes e legais, porquanto colhidos por autoridade sem competência. Ainda que o referido ofício fosse mera comunicação de ciência de acontecimentos submetidos ao controle da CVM, deflagraria a instauração de inquérito administrativo, o qual, para sua validade e existência, teria de ser instruído com respeito ao contraditório e à ampla defesa.


57. Segundo os Defendentes, o presente Inquérito seria nulo por desobediência ao artigo 5.º da Constituição Federal, ao artigo 9.º, parágrafo 2.º, da Lei n.º 6.385/76 e aos artigos 3.º e 7.º da Resolução n.º 454/77, do Conselho Monetário Nacional.


58. No Relatório da Comissão de Inquérito não haveria causa petendi, não tendo sido expostos os fundamentos jurídicos da acusação, em desobediência ao artigo 41 do Código de Processo Penal, ao artigo 182 do Código de Processo Civil e ao artigo 50 da Lei n.º 9.784/99.


59. Alegaram os Defendentes a prescrição em relação às infrações aos artigos 30, parágrafo 3.º, 176 e 153 da Lei Societária, em razão do disposto no artigo 4.º da Lei n.º 9.873/98.


60. Foi alegada, ainda, a nulidade do presente Inquérito em relação ao Sr. Renato Ferreira de Abreu Castro, posto ter sido nele incluído após sua instauração.


61. Da mesma forma, não teriam sido observados os princípios do contraditório e da ampla defesa em relação aos demais acusados, dos quais teria sido suprimido o direito de ser interrogado e convidado a acompanhar e fiscalizar a coleta das provas.


62. As notificações de fls. 08 e segs. seriam nulas, em razão de serem omissas quanto à finalidade da citação, cuja declaração permite que o acusado seja advertido de que deverá apresentar a sua defesa.


63. Alegaram os Defendentes, também, a falta de tipificação, uma vez que, em decorrência do princípio da legalidade, seria inadmissível a acusação baseada em normas abertas ou indeterminadas, cujo conteúdo não esteja clara e circunstanciadamente exposto.


64. A infração ao artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76, por parte do Sr. Renato de Abreu Castro poderia acarretar apenas a nulidade do ato, por ter sido praticado em infração à lei. Além disso, se a caução tivesse existido, teria sido extinta com o contrato celebrado em 27 de dezembro de 1991.


65. Não existiria tipificação e tampouco qualquer dispositivo recriminando a assinatura do contrato.


66. As alegadas infrações aos artigos 176 e 153 da Lei n.º 6.404/76 também padeceriam de falta de tipificação, uma vez que tais normas contêm conceitos jurídicos indeterminados, os quais precisariam ter sido inequivocamente demonstrados.


67. Por fim, aduziram os Defendentes que as cessões de crédito, apontadas como irregulares foram realizadas entre terceiros, não envolvendo a Econômico S/A Empreendimentos e os indiciados não são diretores ou gerentes das empresas envolvidas, não podendo ser responsabilizados por atos de terceiros.


68. Quanto aos ajustes nos preços dos imóveis, não poderiam ser acatados por basearem-se em prova emprestada, a qual seria, como anteriormente mencionado, ilícita e ineficaz, além de se tratar apenas de um papel, sem assinatura e sem estabelecer os critérios adotados para os ajustes.


69. Pelo exposto, requereram os Defendentes o arquivamento do presente Inquérito.


70. O Sr. Jorge Lins Freire, em correspondência datada de 15 de agosto de 2000, afirmou ter permanecido no Conselho de Administração da Econômico S/A Empreendimentos no período de 12 de maio de 1995 a 14 de agosto de 1995, não podendo ser responsabilizado pelas demonstrações financeiras relativas ao exercício social findo em 31 de dezembro de 1995, em razão de encontrar-se afastado da companhia (fl. 928).


71. O Sr. Lafaiete Coutinho Torres enviou correspondência à CVM, em 14 de agosto de 2000, informando seu afastamento da Econômico S/A Empreendimentos a partir de março de 1990 (fls. 926 e 927).





Finalmente, o Sr. Alberto Martins Catharino faleceu em 18 de julho de 1990, conforme Certidão de Óbito de fl. 1.035.


73. Em 26/06/2001, os Srs. Ângelo Calmon de Sá, Antônio Calmon Du Pin e Almeida, Francisco de Sá Júnior, José de Sá Neto, Renato Ferreira de Abreu Castro e Rivaldo Gomes Guimarães apresentaram à CVM proposta de celebração de Termo de Compromisso, com base no parágrafo 5º do artigo 11 da Lei 6.385/76, sendo que não lograram obter aprovação por parte deste Colegiado, conforme reunião realizada em 11.09.2001. Não tendo sido assinado o Termo, deve o feito prosseguir.


É o Relatório.


Rio de Janeiro, 5 de dezembro de 2001


Wladimir Castelo Branco Castro

Diretor-Relator






INQUÉRITO ADMINISTRATIVO CVM N.º 08/98





INTERESSADOS:
ÂNGELO CALMON DE SÁ

ANTÔNIO CALMON DU PIN E ALMEIDA

FRANCISCO DE SÁ JÚNIOR

JOSÉ DE SÁ NETO

RENATO FERREIRA DE ABREU CASTRO

RIVALDO GOMES GUIMARÃES

AIRTON CARDOSO MOURA

ANTÔNIO CÉSAR SÁ LEITÃO

AUDIN - AUDITORES INDEPENDENTES S/C

JORGE LINS FREIRE

LAFAIETE COUTINHO TORRES

ROBERTO STUDART RAMOS DE QUEIROZ


EMENTA :
Escrituração contábil em desacordo com o art. 176 da Lei nº 6.404/76.

Ato de liberalidade, em afronta ao parágrafo 2º do art. 154 da mencionada lei.

Infração do auditor aos arts. 25, incisos III e IV da Instrução CVM nº 216/94, eis que desatendeu a diversas normas brasileiras de contabilidade.


RELATOR: WLADIMIR CASTELO BRANCO CASTRO

VOTO DO RELATOR


I. Do Direito de Defesa e do Devido Processo Legal


1. Os Srs. Ângelo Calmon de Sá, Francisco Sá Júnior, Antônio Calmon Du Pin e Almeida, Rivaldo Gomes Guimarães, Renato Ferreira de Abreu Castro e José de Sá Neto, ditos primeiros Defendentes, e o Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz, alegaram o cerceamento do direito de defesa.


2. Os primeiros Defendentes alegaram, inclusive, que "a mantença deste processo como se fora um só dificulta a defesa pela complexidade e gravidade das acusações", além de violar os artigos 103 e 104 do Código de Processo Civil e os artigos 76 e 77 do Código de Processo Penal, relativos à conexão e à continência.


3. Com relação a esta questão, cabe esclarecer que, na lição de Moacyr Amaral Santos1 a conexão é um vínculo, um elo entre duas ou mais ações, de tal maneira relacionadas entre si que faz com que sejam conhecidas e decididas pelo mesmo juiz, e, às vezes, até no mesmo processo. A continência, segundo o mesmo autor, seria espécie do gênero conexão.


4. Assim sendo, é notória a inaplicabilidade dos referidos conceitos ao presente Inquérito, pelo simples fato de que nunca houve duas ou mais ações. Houve, outrossim, a instauração de um Inquérito, destinado a apurar irregularidades na Econômico S/A Empreendimentos, no decorrer do qual foram indiciadas as pessoas relacionadas às ilicitudes detectadas.


5. A alegação dos primeiros Defendentes, relativa ao cerceamento do direito de defesa, pelo fato de alguns dos indiciados terem sido notificados após o encerramento da fase investigatória, por ocasião da apresentação do Relatório da Comissão de Inquérito, também não merece acolhida, por falta de respaldo na melhor doutrina jurídica.


6. Os Defendentes partem do princípio de que o indiciado deveria ter sido notificado logo no início do procedimento investigatório, de sorte a acompanhar a coleta das provas.


7. A CVM, em seus inquéritos e processos administrativos, procede em absoluta conformidade com o regramento contido na Resolução n.º 454/77, do Conselho Monetário Nacional, ora modificada pela Resolução CMN n.º 2785, de 18 de outubro de 2000. Tanto em sua versão anterior, quanto na presente, há clara distinção entre as duas fases: a investigatória, inquisitorial e a litigiosa, contraditória.


8. A Resolução CMN n.º 454, vigente à época dos fatos, preceituava, em seu artigo 2.º, considerar-se o inquérito instaurado com a sua notificação, por escrito, aos indiciados. Conforme o artigo 8.º da mesma Resolução, a apresentação de defesa pelo indiciado instaura a fase litigiosa do procedimento, com a formação do processo administrativo. Esta disposição foi mantida pela Resolução CMN n.º 2.785/2000, ou seja, dispõe claramente que apenas com a apresentação da defesa, por parte do acusado, instaura-se a fase litigiosa do procedimento.


9. A CVM observou, na condução do presente inquérito, o rito adequado, que, à época dos fatos, era aquele constante da Resolução CMN n.º 454/77. Os interessados foram notificados da abertura do presente inquérito (fls. 008 a 14, 899 a 904, e 921), foram intimados a apresentarem suas defesas (fls. 905 a 917, 922 e 1033), tiveram acesso aos autos, inclusive deles tirando cópias e contraditaram as responsabilidades que lhes foram atribuídas, ocasião em que poderiam ter protestado pela produção de quaisquer provas em Direito admitidas. Assim sendo, não houve, em momento algum, cerceamento do direito de defesa dos indiciados.


10. Por conseguinte, é de se rejeitar a preliminar relativa ao suposto cerceamento de defesa, tanto para os indiciados que foram notificados após a Portaria Presidencial, quando se inicia a fase investigatória, quanto para aqueles que foram notificados por ocasião da aprovação do Relatório da Comissão de Inquérito, quando se inicia a fase contraditória.


10. Com relação à notificação de indiciados após a elaboração do Relatório da Comissão de Inquérito, cabe citar ementa de acórdão do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região, no Agravo de Instrumento (n.º 97.03.089832-7) interposto pela CVM em razão de decisão liminar proferida pelo MM. Juízo da 5.ª Vara Federal, em Ação Cautelar proposta por indiciado no Inquérito Administrativo CVM n.º 12/95, Inquérito este, aliás, mencionado pelos primeiros Defendentes em sua defesa:

(....)

O inquérito administrativo foi regularmente instaurado, e não é dado ao Judiciário interferir no mecanismo de apuração de ilícitos, cerceando o direito da agravante de dar seguimento a essa apuração, proibindo o envio do procedimento ao órgão ministerial.


Proibir que atividade ilícita de alguém seja regularmente apurada, não se coaduna com o papel do Judiciário, e efetivamente em matéria de mercado financeiro, a atuação firme e pronta do órgão fiscalizatório faz-se necessária, sob pena de, desajustado esse mercado, pela ocorrência de fraudes, afetar-se até mesmo a credibilidade internacional do país.


Não havendo no relatório qualquer punição, mas simples constatação para apuração das infrações indicadas, à semelhança do que ocorre com o próprio inquérito policial, é mesmo a hipótese de reforma da decisão, para que, prosseguindo-se, sejam os autos encaminhados ao Ministério Público para as providências que entender necessárias" (sem grifos no orginal).


11. Com efeito, o Relatório da Comissão de Inquérito consigna o resultado de apuração de materialidade e autoria, levada a cabo pela CVM. Antes de concluída a apuração, não é possível à CVM saber quem são, de fato, as pessoas relacionadas às irregularidades detectadas. Concluída a apuração e arroladas as pessoas eventualmente relacionadas às irregularidades, são elas notificadas, se não o foram a priori. Concluído o relatório e notificados os interessados, inicia-se a fase contraditória do rito.


12. Não há, assim, que se falar em cerceamento do direito de defesa e em nulidade do presente Inquérito, uma vez que o procedimento adotado pela CVM acha-se revestido de constitucionalidade e de legalidade.


II. Da Prova Emprestada


13. Alegaram os primeiros Defendentes que o presente Inquérito sustenta-se nos elementos colhidos pelo Banco Central, acostados às fls. 15/852, os quais não seriam provas eficazes e legais, porquanto colhidas por autoridade sem competência, dado que o Banco Central "não tem ingerência nas matérias cometidas à Comissão de Valores Mobiliários pela lei".


14. Moacyr Amaral Santos 2, ao abordar o problema da eficácia da prova emprestada, assim dispõe: "o problema não diz respeito às provas pré constituídas e às documentais em geral, pois essas, originais ou emprestadas, valem, igualmente, em qualquer juízo em que forem apresentadas".


15. Os próprios Defendentes referem-se aos anexos de fls. 15/852 como documentos (fls. 1.103), cujo teor, ao menos presume-se, há de ser sempre o mesmo, onde quer que sejam apresentados.


16. Incabível, portanto, a alegação de que os documentos de fls. 15 a 852 não são provas eficazes e legais, posto tratar-se, em sua quase totalidade, de provas documentais, cuja autenticidade não foi contestada em momento algum.


III. Da Prescrição


17. Alegaram os primeiros Defendentes e o Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz a prescrição da pretensão punitiva da CVM.


18. A prescrição em relação aos ilícitos praticados no âmbito do mercado de capitais pode ser alegada, tão somente, com fundamento na Lei n.º 9.873/99, a qual dispõe em seu artigo 4.º:


Art. 4.º Ressalvadas as hipóteses de interrupção previstas no artigo 2.º, para as infrações ocorridas há mais de três anos, contados do dia 1.º de julho de 1998, a prescrição operará em dois anos, a partir dessa data (sem destaques no original).


19. Entre as causas interruptivas da prescrição, mencionadas no artigo 2.º, estão a citação do indiciado ou acusado e qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato.


20. Assim, as notificações dos indiciados, a aprovação do Relatório da Comissão de Inquérito, as intimações para apresentação de defesa são causas interruptivas da prescrição, levando à óbvia conclusão de que a mesma não ocorreu.


IV. Do Artigo 30, § 3.º, da Lei n.º 6.404/76


21. O Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz, Diretor da Econômico S/A Empreendimentos, e os Srs. Antônio César de Sá Leitão e Renato Ferreira de Abreu, Diretores da CONEPAR, foram responsabilizados por terem assinado contrato de mútuo, no qual a CONEPAR, mutuante, recebeu em garantia ações de sua própria emissão.


22. O Sr. Antônio César de Sá Leitão alegou desconhecer a proibição constante do artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n. 6.404/76. É sabido, porém que ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece3. Alegou, ainda, desconhecer que a garantia do contrato de mútuo consistia em ações de emissão da própria CONEPAR. Tal alegação igualmente não procede, dado que o contrato, com a estipulação da garantia, foi por ele assinado (fls. 165 a 170).


23. O Sr. Renato Ferreira de Abreu Castro, por seu turno, alegou que, em razão de ter sido realizado em infração ao citado artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei Societária, o ato seria nulo. Ainda que o ato fosse nulo, questão sobre a qual não cabe à CVM manifestar-se, não estaria afastada a irregularidade praticada, da mesma forma que não a afasta a posterior extinção da garantia.


24. Embora a Econômico S/A Empreendimentos não tenha recebido as próprias ações em garantia, ela é controladora da CONEPAR, o que faz com que o contrato de mútuo celebrado seja, em última instância, tido como self dealing transaction, cabendo ao Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz a mesma responsabilidade imputada aos Diretores da CONEPAR.


25. Assim sendo, voto pela responsabilização do Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz, Diretor da Econômico S/A Empreendimentos, e dos Srs. Antônio César Sá Leitão e Renato Ferreira de Abreu Castro, Diretores da CONEPAR, por infração ao disposto no artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76.


V. Dos Artigos 176 e 153 da Lei n.º 6.404/76



Conforme mencionado detalhadamente no Relatório da Comissão de Inquérito (fls. 879 a 884), o Banco Econômico S/A cedeu créditos para empresas controladas indiretamente por ele próprio e pela Econômico S/A Empreendimentos.


27. Tais cessões de crédito foram contabilizadas, segundo o Relatório, pelo seu valor atualizado, e não pelo seu provável valor de realização. Ao terem contabilizado tais créditos da forma como o fizeram, a CST Consultoria de Vendas Ltda. e a CST Empreendimentos e Participação Santana do Parnaíba Ltda. deveriam ter feito as respectivas provisões, o que não ocorreu, conforme se verifica a partir da análise de seus balanços (fls. 368 a 380).


28. As cessões de crédito, contrariamente ao alegado pelos administradores da Econômico S/A Empreendimentos, não foram realizadas entre terceiros. Do balanço patrimonial da Econômico S/A Empreendimentos, controladora, consta a avaliação dos patrimônios líquidos das suas controladas, às quais foram cedidos os créditos, e as irregularidades existentes nos balanços destas irão repercutir, em decorrência da equivalência patrimonial, no balanço da controladora.


29. Cite-se, a título de argumentação, que a controladora deve, inclusive, constituir provisão para cobertura de perdas decorrentes de eventos que resultaram em perdas não contempladas no balanço de suas controladas4. Logo, não procede a alegação, por parte da Econômico S/A Empreendimentos, no sentido de ser terceira estranha à cessão de créditos às suas controladas.


30. Além das cessões de crédito, há a questão relativa aos valores atribuídos aos imóveis pertencentes à Econômico S/A Empreendimentos.


31. Dispõe a Lei n.º 6.024/745 que cabe ao interventor realizar o inventário dos bens da entidade sob intervenção. Salvo prova em contrário, presume-se que tal inventário tenha sido realizado com a observância dos preceitos legais aplicáveis e qualquer alegação relativa aos ajustes realizados pelo interventor foge não só do âmbito do presente Inquérito, como da esfera de atuação da CVM.


32. À vista das irregularidade apontadas, o balanço da Econômico S/A Empreendimentos não refletiu, evidentemente, a real situação de seu patrimônio.


33. O artigo 176 da Lei n.º 6.404/76 dispõe:


Ao fim de cada exercício social a Diretoria fará elaborar, com base na escrituração mercantil da companhia, as seguintes demonstrações financeiras que deverão exprimir com clareza a situação do patrimônio da companhia e as mutações ocorridas no exercício:

(....)

34. Cabe ressaltar, inicialmente, que foi decretada intervenção na Econômico S/A Empreendimentos em 7 de fevereiro de 1996 (fls. 432) e as irregularidades em sua escrituração contábil denunciadas pelo Banco Central à CVM antecederam a decretação da intervenção (fls. 015).


35. A responsabilidade por infração ao disposto no artigo 176 é, porém, da Diretoria da companhia, razão pela qual deixo de responsabilizar os membros do Conselho de Administração por infringência ao referido artigo.


36. Os Diretores da Econômico S/A Empreendimentos, à vista das irregularidades apontadas, não foram diligentes em relação à elaboração do relatório. Os membros do Conselho de Administração também não o foram, pois compete-lhes, nos termos da lei, fiscalizar a gestão dos diretores e examinar livros e papéis da companhia (art. 142, III, da Lei n.º 6.404/76).


37. Dessa forma, tanto os diretores quanto os conselheiros de Administração da Econômico S/A Empreendimentos devem ser responsabilizados por infração ao artigo 153 da Lei n.º 6.404/76, em decorrência do disposto no artigo 145 da mesma Lei.


VII. Da Infração aos Artigos 25 e 29, incisos III e VII, da Instrução CVM n.º 216/94


38. As "Normas de Auditoria Independente das Demonstrações Contábeis" (NBC-T-11) e as "Normas Profissionais de Auditor Independente" (NBC-P-1), aprovadas, respectivamente, pelas Resoluções n.º 700/91 e n.º 701/91, do Conselho Federal de Contabilidade, vigentes à época dos fatos, contemplam os procedimentos a serem observados pelos auditores.


39. O artigo 25 da Instrução CVM n.º 216/94, também vigente à época dos fatos, impõe ao auditor independente - pessoa física e ao auditor independente - pessoa jurídica, a todos os seus sócios e demais integrantes do quadro técnico o dever de observar as normas emanadas do Conselho Federal de Contabilidade, no que não conflitar com os atos desta Comissão, no que se refere à conduta, ao exercício da atividade e à emissão de parecer e relatórios de auditoria6.


40. A não observância pelo auditor, dos deveres impostos pela regulamentação, por si só, caracteriza a infração, ou seja, basta a não observância do dever imposto pela regulamentação para que o auditor cometa a infração.


41. Conforme demonstrado nos parágrafos 44 a 47 do Relatório da Comissão (fls. 886 e 887), não foram observados os deveres impostos pelos artigos 25 e 29, incisos III e VII. Assim sendo, voto pela responsabilização da Audin e de seu responsável técnico, por infração ao disposto nos citados artigos.


42. Diante de todo o exposto e com fundamento no artigo 11 da Lei n.º 6.385/76, voto pela aplicação das seguintes penalidades:



ao Sr. Ângelo Calmon de Sá, Presidente do Conselho de Administração da Econômico S/A Empreendimentos, pena de inabilitação para o exercício do cargo de administrador de companhia aberta pelo prazo de 3 (três) anos, por infração ao disposto no artigo 153 da Lei n.º 6.404/76;



ao Sr. Rivaldo Gomes Guimarães, Vice-Presidente do Conselho de Administração e Diretor da Econômico S/A Empreendimentos, pena de pena de inabilitação para o exercício do cargo de administrador de companhia aberta pelo prazo de 2 (dois) anos, por infração ao disposto nos artigos 176, caput, e 153 da Lei n.º 6.404/76;



ao Sr. Antônio Calmon Du Pin e Almeida, membro do Conselho de Administração da Econômico S/A Empreendimentos, pena de pena de inabilitação para o exercício do cargo de administrador de companhia aberta pelo prazo de 1 (um) ano, por infração ao disposto no artigo 153 da Lei n.º 6.404/76;



ao Sr. Francisco de Sá Júnior, membro do Conselho de Administração da Econômico S/A Empreendimentos, pena de pena de inabilitação para o exercício do cargo de administrador de companhia aberta pelo prazo de 1 (um) ano, por infração ao disposto no artigo 153 da Lei n.º 6.404/76;



ao Sr. José de Sá Neto, membro do Conselho de Administração e Diretor da Econômico S/A Empreendimentos, pena de pena de inabilitação para o exercício do cargo de administrador de companhia aberta pelo prazo de 1 (um) ano, por infração ao disposto nos artigos 176, caput, e 153 da Lei n.º 6.404/76;



ao Sr. Roberto Studart Ramos de Queiroz, Diretor da Econômico S/A Empreendimentos, pena de pena de inabilitação para o exercício do cargo de administrador de companhia aberta pelo prazo de 1 (um) ano, por infração ao disposto nos artigos 30, parágrafo 3.º, 176, caput, e 153 da Lei n.º 6.404/76;


ao Sr. Antônio César Sá Leitão, Diretor da CONEPAR, pena de multa de R$ 3.681,79 por infração ao disposto no artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76;



ao Sr. Renato Ferreira de Abreu Castro, Diretor da CONEPAR, pena de multa de R$ 3.681,79 por infração ao disposto no artigo 30, parágrafo 3.º, da Lei n.º 6.404/76;



à Audin Auditores Independentes S/C, pena de multa de R$ 3.681,79, por infração ao disposto nos artigos 25 e 29, incisos III e VII, da Instrução CVM n.º 216/94; e, finalmente



ao Sr. Airton Cardoso Moura, responsável técnico da Audin, pena de multa de R$ 3.681,79 por infração aos artigos 25 e 29, incisos III e VII, da Instrução CVM n.º 216/94.


43. Finalmente, voto pela exclusão do Sr. Alberto Martins Catharino, em decorrência de seu falecimento e pelo acolhimento das razões de defesa dos seguintes senhores:



Sr. Lafaiete Coutinho Torres, em razão de encontrar-se afastado da Econômico Empreendimentos S/A desde 15 de março de 1990, conforme ata de reunião do Conselho de Administração de fls. 927;



Sr. Jorge Lins Freire, por ter permanecido no Conselho de Administração apenas no período de 12.05.95 a 14.08.95, conforme doc. às fls. 936.


É o meu voto


Rio de Janeiro, 5 de dezembro de 2001



Wladimir Castelo Branco Castro

Diretor-Relator


1. Moacyr Amaral Santos, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 20.ª ed., 1.º vol., p. 257 e segs.

2. Moacyr Amaral Santos, ob. cit., 2.º vol. , p. 363 e segs.

3. Lei de Introdução ao Código Civil, art. 3.º.

4. Instrução CVM n.º1, item XIX, "a", 1, vigente à época dos fatos. A Instrução CVM n.º 247/96, ora em vigor, dispõe no mesmo sentido, em seu artigo 12, I, "a".

5. Lei n.º 6.024/74, art. 9.º, "b".

6. A Instrução CVM n.º 308/99, ora em vigor, dispõe no mesmo sentido (arts. 20 e 37).


Voto do Diretor Marcelo Trindade

Acompanho o voto do Relator

Voto do Presidente José Luiz Osorio de Almeida Filho

Acompanho o voto do Relator


Os acusados punidos terão um prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento de comunicação da CVM, para interpor recurso, com efeito suspensivo, ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, nos termos do parágrafo único do artigo 14 da Resolução nº 454, de 16.11.77, do Conselho Monetário Nacional, prazo esse, ao qual, de acordo com orientação fixada pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, poderá ser aplicado o disposto no art. 191 do Código de Processo Civil, que concede prazo em dobro para recorrer quando litisconsórcios tiverem diferentes procuradores.

A CVM oferecerá recurso de ofício ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional de sua decisão no tocante às absolvições proferidas.

Proferiu defesa oral o Dr.


Participaram do julgamento os seguintes membros do Colegiado: Diretor Wladimir Castelo Branco Castro, Relator; Diretor Marcelo Fernandez Trindade e o Presidente José Luiz Osorio de Almeida Filho."
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u36857.shtml



 
A queda do barão da BahiaÃngelo Calmon de Sá: Sic transit gloria mundi
05/10/2008 01:00
Personagem
A queda do barão da Bahia
O bolodório retado que azucrinou o sossego do banqueiro predileto das elites, ÂNGELO CALMON DE SÁ, homem católico e caridoso, o último aristocrata autêntico que ainda usufruía de fama, dinheiro e poder. Da série "OS DONOS DO BRASIL -- A vida construtiva de elites perdidas, granfinos decadentes e cintilantes emergentes"

                                                                                            por Hugo Studart
          Duas mil orquídeas, mil antúrios híbridos e quinze galerias de tapetes persas espalhados pela nave do Mosteiro de São Bento ainda emprestaram uma certa suntuosidade merecida ao acontecimento. Foram despachados 2.600 convites e, pelo calor humano denunciado nas maquiagens de algumas "baroas*, é provável que ninguém tenha faltado. O trânsito do Centro Histórico de Salvador foi desviado para dar vazão aos tilburis turbinados. Fora do templo, um enxame de mulembos desandava a aplaudir a noiva, linda como princesa, e se acotovelava para tirar uma lasquinha daquele que prometia ser um bolodório retado.
          Mas a recepção, na casa da donzela, foi o primeiro sinal exterior de que algo de bodoso estava ocorrendo no bolso do paizão. Para começar, havia apenas 750 convivas e uma renca de quase 2 mil barrados. O salmão chileno foi servido com regulagem espaçosa e o caviar era norueguês, dos baratos, desses de 250 dólares o quilo. Uísque, somente oito anos, John Walker Red Label, os mais óbvios, e o vinho era adocicado, Liebfralmilch, ideal para bárbaros alamanos. Ainda houve uma certa concessão na primeira rodada de champanhe, Veuve Cliquot, mas os garçons logo mandaram braza num M.Chandon, nacional. Teria sido tudo muito correto no casamento de Ana e Pedro, até perfeito, fossem eles dois jovens ricos, apenas ricos, ou mesmo fizessem parte dessa tal Sociedade Emergente. Ficou fora do tom por conta da linhagem nobre do casal.
          Aninha é filha do magnata Ângelo Calmon de Sá, duas vezes ministro da República, industrial da petroquímica, dono de três fábricas de Coca-Cola, maior exportador de cacau do Brasil, capo de uma das grandes criações de nelore do mundo e, naqueles dias, chairman do mais antigo banco da América Latina, o Econômico, potência de 161 anos. Pedro, de sobrenome Didier, também é egresso de uma das mais nobres cepas locais. É neto e herdeiro de Luis Vianna, político de megatonagem e história, ex-governador, ministro, senador e biógrafo do grande Rui Barbosa, aliás, maior biógrafro das terras abaixo do Equador.

          ANNUS TERRIBILIS      
          Enfim, em se tratando do regabofe de tal granfinagem, esperava-se lambicagens com o de sempre, a saber, salmão do Mar do Norte, caviar Beluga da Rússia (1.000 dólares o quilo) e Chivas a rodo. Semanas depois, quando o pai da noiva quase ilustrou as páginas policiais da imprensa por conta do sururu que foi a quebra de seu banco, descobriu-se que o casamento de Ana e Pedro havia se tornado versão do Baile da Ilha Fiscal, a última aparição social daquela velha aristocracia brasileira alfabetizada em francês.
          Jorginho Guinle e Carmem Terezinha Mayrink Veiga eram os representantes mais besuntados dessa linhagem, iniciada ainda no desmanche do Segundo Império. Ângelo Calmon de Sá, sucessor legítimo do Marquês de Abranches, hoje conhecido por Barão da Bahia, havia se transformado no príncipe nacional dos aristocratas, um dos derradeiros remanescentes dessa gente realmente rica, fina e poderosa. Lutrido como um Bill Gates e com sestros de work-a-holic, Doutor Ângelo parecia ser o único lorde credenciado a entrar na Era Pós-Moderna com cabedal para enfrentar a chibata do povo da Sociedade Emergente, outrora denominados noveaux-riches, que tomaram por completo o poder econômico e político no Brasil.
          Quando ocorreu esse casório, em abril, Jorginho Guinle já precisava dar calote em chofeur de taxi, Regina Marcondes Ferraz filava destilados fuleiros no camarote da Brahma e a Justiça já havia determinado o arresto dos tapetes Hamadann dos Mayrink Veiga. Sobrara, apenas, Ângelo Calmon de Sá, na Bahia, e Olavo Monteiro de Carvalho, no Rio. A tragédia do príncipe baiano chegou em agosto, quando Fernando Henrique Cardoso decidiu-se estropiar com o Banco Econômico. Diria Elizabeth II que 1995 foi deveras um Annus Terribilis.
  
         IMPLANTE CAPILAR
          A época escolhida pelos picunhetos diretores do Banco Central para intervir no Econômico foi de uma esculhambação só. Ângelo ainda estava desenxabido em casa quando foi obrigado a vir a público enfrentar o tangolumango. Reparava-se de uma intervenção múltipla numa clínica da rua Dona Mariana, Rio de Janeiro, dirigida por Ivo Pitangui. Pelo que consta, esticou umas pelancas e implantou novas moitas capilares. Aproveitou para fazer outro tingimento e remoçou prá lá de cinco anos. Ângelo ainda passou quase uma semana recolhido, armando com advogados paulistas e com a patriótica bancada política baiana, enquanto lá fora os correntistas, febrentos da vida, acusavam o barão de comidilhas mil com o dinheiro alheio.
         “O banco não quebrou”, jura, de mãos-juntas, Ângelo Calmon de Sá. “Escreve que o Econômico sofreu foi uma grande redução dos depósitos à vista provocada por boatos de mercado. Isso nos levou à linha de redesconto do Banco Central (Tradução: cheque especial para bancos). Mas não quebramos, tem outros no redesconto, que foi feito para isso mesmo, para evitar a quebra dos bancos”.
          Ângelo era o orgulho da Bahia. Ele sempre confiou no seu taco e é capaz de ministrar aulas de auto-estima a Lair Ribeiro. Numa tarde de sexta-feira, quinze dias depois da cangacha, quando os tufos da cabeça já haviam desassanhado, o barão apareceu de surpresa para os diretores exilados do Econômico. Proibidos pelo Banco Central de adentrar na sede da instituição, eles vinham se reunindo diariamente em um prédio ao lado para prosear sobre as viscissitudes da vida. Ele encontrou os ex-bancários num tremendo chororô.
          “Que cara de defundo é essa? ”, ralhou o ex-banqueiro, lépido e faceiro. “Isso tudo é transitório, daqui a alguns dias estaremos todos de volta ao comando do banco”.
            Ficaram todos pasmados, com cara de banana-mole. Ou o barão seria um gênio ou ficara abilolado. Ou imaginava alguma cartada secreta para tomar o banco das mãos de FHC, ou havia perdido de vez a noção da estaboca em que se metera. Fernando Collor, a quem Ângelo serviu como ministro, depois do impeachment passou a vestir terno e gravata para ler os jornais que chegavam à Casa da Dinda, no melhor estilo de Napoleão com sua corte de bozengas no exílio em Santa Helena. A esta altura, prá mais de três meses depois da intervenção, já se sabe se Ângelo Calmon de Sá também ficou pirado.  

         O GENTE FINA
          É um sujeito por demais elegante e agradável, o barão. Só usa gravatas italianas, sapatos de cromo alemão, camisas francesas e ternos de corte inglês azul marinho. Esmera-se por manter os fios de cabelo no lugar. Os mauricinhos baianos o têm como o maior dos porretas. Há trinta anos que pega no batente por volta das 7 da madrugada, antes de qualquer funcionário.
          Quem quiser lhe falar com calma, precisa marcar hora antes das oito. Depois, sua vida vira um auê. Na frente do banco, eram 120 telefonadas por dia e viagens de jatinho dia-sim-dia-não para jantar com Carlos Menen ou almoçar com amigos banqueiros na Suíça. Mesmo lenhado, restou prá mais de dúzia de empresas sob sua administração. Reclama apenas do desespero de não ter mais para onde ir às 7 da manhã.
          Gente fina que é, Ângelo jamais levantou a voz para pessoa alguma, tem memória malufista e é capaz de concatenar com rara competência números com situações, o que torna sua conversa agradabilíssima. Geralmente consegue saber onde o interlocutor quer chegar antes da primeira frase terminar. Estudioso, versa com conhecimento de causa sobre temas como mercado internacional de petróleo e integração da América Latina.
          Só fala de improviso e costuma emborcar fácil a cabeça da platéia. Quinze dias antes da intervenção no banco, foi a Belo Horizonte fazer uma palestra explicando por que o sistema de irrigação brasileiro não está funcionando. Foi aplaudido de pé. Uma especialista pediu a palavra para dizer que nunca tivera aula tão profunda ou vira homem tão brilhante.

         A ASCENSÃO DO PRÍNCIPE
          Não pensem que Ângelo Calmon de Sá quebrou o banco com o intuito de desviar dinheiro público para seus negócios particulares, como se escreveu por aí. Esse sujeito virou chefão do Econômico com apenas 34 anos. Era um banquinho chulé, o 43 no ranking nacional, e as muitas famílias de acionistas queriam vendê-lo para investir em negócios mais rentáveis. O Econômico nascera quando Pedro II era ainda rapazola e o Regente Feijó era o rei-da-cocada-preta. Nos Anos 60, fora administrado por Miguel Calmon, deputado influente e ministro da Fazenda de João Goulart. Era tio de Ângelo e não tinha filhos. Indicou o sobrinho, primeiro, secretário da Fazenda da Bahia. Quando terminou o governo, Ângelo se impôs sozinho às demais famílias como o mais talhado para dirigir o banco.             
         Ele havia tido aquilo que nossas avós chamam de “educação esmerada”, mas não possuía um centavo no bolso. Avionado, saiu comprando outros bancos menores e formando um conglomerado financeiro. Em cinco meses, passou a 29 no ranking. Em 1995, o Econômico era o sétimo no ranking, com R$ 9 bilhões em depósitos, e formava um grupo com  42 empresas, 35 delas em áreas não financeiras, como petroquímica e empreitagem. O capo Ângelo, por sua vez, saiu do nada para ser dono de 40% das ações do grupo e acumulara, ainda, 93 milhões em bens pessoais,  declarados ao Imposto de Renda. Como ele conseguiu?
          “Trabalhando mais que qualquer um”, explica Antônio Carlos Magalhães, seu ex-amigo, hoje desafeto.
          Há 20 anos, o principe baiano foi chamado por Ernesto Geisel, então imperador do Planalto, para presidir o Banco do Brasil. Logo depois seria promovido a intrépido ministro da Indústria e do Comércio. Garantem seus desafetos que retornou a Bahia com o rei-na-barriga. Nessa época, era cheio de nove-horas. Mantinha um elevador exclusivo na sede do banco e viajava sozinho no jato particular; os diretores iam para o mesmo lugar em avião de carreira. Sejamos justos: há muito que o topete baixou. Ângelo liberou o elevador para a patuléia e as caronas de jatinho para os mais taludos.
          Há uma década, construiu uma nova sede para o conglomerado e passou a inaugurar uma agência do Econômico por semana, nos mais longínquos mequetrefes baianos. Chegou a ter 726 agências, quase tantas quanto o Banco do Brasil. Foi nessa época que começou a se meter em canganchas com Paulo Sérgio Tourinho, dono da seguradora Aliança da Bahia, com 130 anos no mercado e 33% das ações do Econômico. Começaram também os primeiros problemas no banco.
          “Talvez o Ângelo tenha sido moço demais presidente do Banco do Brasil”, ironiza Tourinho. “Ele não se acostumou com os números mais modestos da iniciativa privada. Retornou de Brasília como um piloto de Fórmula 1 tendo que andar a 80 por hora nas ruas da cidade”.

          O INIMIGO INTERNO
          Tourinho, outro baronete, é o oposto do sócio. Discretíssimo, foge da promoção como o Demo da cruz. Se desloca num Opala muxibento. Dedica boa parte do seu tempo ao Hospital Aliança, espécie de Albert Einstein da Baixa do Sapateiro. Certa feita, quando ainda era o maior acionista do Econômico, o baronete levou Angelo para conhecer uma de suas possessões rurais. Exercitando seu fino humor inglês, apresentou o presidente do banco ao capataz.
          “Você pensa que é meu empregado mais bem pago?”, provocou Tourinho. “Pois saiba que o doutor Ângelo aqui ganha muito mais do que você”.
          A partir desse dia doutor Ângelo passou a comprar ações desbragamente, até que sua holding, a Aratú, superou a Aliança. Tourinho e Angelo jamais poderiam dar certo um com o outro. O primeiro é um lorde inglês. Gravatas lisas, paletós de tweed, cavanhaque, fala baixo, não teme exús e não dá intimidade a orixá  algum. Enfrenta fila em aeroportos e carrega ele mesmo seus badulaques. Resolveu dar sua contribuição social construindo do próprio bolso um hospital de primeiro mundo onde a elite nordestina vai curar suas ziqueziras.
          Ângelo é um executivo yuppie, sempre sorridente, disponível para um papo descompromissado e louco por fofocas e política. Só viaja (ou melhor, viajava) de jatinho, em um dos dois jatinhos Marcel Dassault da frotilha do Econômico. Sentia-se melhor num modelo Falcon 20, único no Brasil, deixando o Falcon 10, um tiquinho menor, para o extrovertido irmão Frank. Ajudou muito Irmã Dulce e continua mão aberta com a nova caritosa da moda, Irmã Rosa de Feira de Santana. Sempre que visitado pelas religiosas, se virava para arrumar dinheiro no exterior junto a essas provedoras de ONGs. Depois da quebra do banco, o baronete o fulminou o barão:
          “Quem quer ser não pode querer ter. Não se pode ser banqueiro quem quer ser político. Quem pode imaginar o José Safra prefeito de Tel Aviv?”
          Angelo descomplica sua relação com o sócio usando apenas uma palavra para definí-lo: “Omisso”.

         O ENCOSTO ACM
          Como o Banco Econômico de repente virou creca, o barão baiano passou a ser tratado como malestroso. Não pôde sequer limpar as gavetas do escritório em jacarandá-de-lei, decorado com a maior sobriedade pela paulista Turquinha Muniz. Carmem Mayrink Veiga, diga-se, enfrentou situação bem mais vexatória. Vestida de robe de chambre, assistiu a um oficial de justiça classificar seu tabliz de 100 mil dólares de “bodum em petição de miséria”. O barnabé não quis sequer arrestar o tapete e, diante dos protestos, decretou para a madame: “Sou mais o meu Tabacow”. Ângelo Calmon de Sá, pelo menos, foi substituído por um funcionário público de façanhas passadas no currículo, que está seco para tirar o Econômico da pocilga.
          É provável que Ângelo tenha desandado por conta das mesmas mandingas pessoais que outrora o despacharam às alturas. Refiro-me à sua ambição. Ele sempre quis ser rico e poderoso. O primeiro objetivo, há muito atingiu. Quanto ao segundo, esbarrou desde sempre em um encosto chamado Antônio Carlos Magalhães. Há 25 anos que Ângelo está de orelha em pé por uma chance de governar a Bahia. Tem até frases sobre como encarar apoquentes do poder: “Homem público tem que estar preparado para ser chamado de ladrão ou veado”, disse certa vez. “Graças a Deus ainda não me chamaram de veado”.
          Ainda aos 34, quando acabara de assumir o banco, Ângelo sondou o amigo Antônio Carlos, ex-prefeito de Salvador, sobre a possibilidade de ser nomeado governador por Emílio Médici. “Não é possível, pois quem vai ser o governador sou eu”, respondeu. Em 1978, quando deixava o ministério, novamente pageou o cargo, desta em nomeação do chefe Ernesto Geisel. ACM deu-lhe um beiço pela segunda vez.
          Em 1982, credenciou-se junto a ACM para ser o candidato do PDS, agora em eleição direta. O escolhido foi Clériston Andrade, que morreu em campanha. Parecia chegara a vez de Ângelo, ufa! Foi barrado pela legislação eleitoral da época, que impedia candidatura de banqueiros. Em 1990, lá estava Ângelo de novo; de novo Antônio Carlos se auto-escolheu candidato. Pela quinta vez, agora muito de leve, o banqueiro ainda chegou a sondar o babalorixá para o pleito do ano passado, mas ele se fez de desentendido. “Meu candidato sempre foi o Paulo Souto”, explica ACM, referindo-se ao atual governador dos baianos.
          Quando Ângelo casou a filha, Antônio Carlos recusou-se a prestigiar a recepção. Jantou à vista de todos no Alfredo di Roma, a manjedoura mais badalada do pedaço, e ainda explicou a quem perguntasse que  considerava a festança do bacana um acinte para com a barangada faminta. Ainda mais porque o banco, já se sabia na ocasião, havia se transformado em um lupanar financeiro e estava ameaçado havia quase um ano de sofrer intervenção dos xerifes de Brasília.
  
         O GAGO E A MAÇARANDUBA
          As ligações jurídicas entre os dois são fortes. Mas como pessoas físicas, não frequentam os mesmos lugares e raramente são vistos em convescotes de finais de semana. Dizem os amigos que Ângelo tem fascínio e medo de Antônio Carlos. Este, por sua vez, não deu trela para o barão e nunca permitiu que ele criasse asinhas. ACM, jamais escondeu que Angelo seria um desastre administrativo e não teria a menor chance em uma eleição direta. Angelo recebia Irmã Dulce sem hora marcada, mas não participa da festa do Senhor do Bonfim, por exemplo. Antônio Ermírio de Moraes, o barão paulistano, pelo menos gosta de ser chamado de Tonhão e tem outros vezos populistas.
          É inimaginavel cogitar que um dia o barão baiano lasque o beiço numa vendedora de acarajé do Pelourinho. O curioso é que os dois, o magnata e o manda-chuva, têm a maior parte dos amigos em comum. Antônio Carlos Magalhães Júnior, o primogênito do babalorixá e seu suplente no Senado, foi por uma década alto funcionário do Econômico. Saiu porque o barão nunca permitiu que ele chegasse à Diretoria.
          Ângelo sempre compareceu com ajuda de peso, em maçaranduba, nas campanhas da Arena, depois do PDS, depois PFL. Escondido de ACM, também soltou algum capilé para a campanha da atual prefeita de Salvador, Lídice da Matta, ex-PC do B, hoje abrigada entre os tucanos. Reza o folclore político que a entrega do agrado foi feita pelo mordomo daquela vetusta mansão do Morro das Mangueiras, onde mora o capitalista, ao namorado da então candidata comunista. Sôfrego, correu para o comitê com um grande pacote pardo  debaixo do braço. Teve um ataque de gagueira ao perceber que alí só tinha um monte de cédulas de pequeno valor, ou seja, dinheiro para despesas miúdas...
          “Angelo jamais quebraria o Econômico”, defende o ex-exilado da ditadura (da qual o barão foi ministro), Ubirajara Brito, cientista nuclear baiano, formado pela Sorbonne. “O que se cometeu foi um crime dos mamelucos paulistas contra o Brasil tupiniquim”. O ex-perseguido e o ex-ministro foram colegas de ginásio. No exílio parisiense do amigo, Angelo sempre dava um jeito de visitá-lo escondido dos chefes militares.
          Essa, a de cultivar amizades, é uma das virtudes do aristocrata, a quem hoje só se imputam defeitos. Embora o general Ernesto Geisel (R$ 300 mil), o ex-ministro Mailson da Nobrega (R$ 60 mil), o embaixador Paulo Tarso Flexa de Lima (quase todas as economias) e Dom Eugêncio Salles (todo o dinheiro da Cúria), tenham micado nas mão do outrora confiável banqueiro-amigo, que sem avisá-los arrancou, no dia da intervenção, sacou R$ 10 mil para “despesas miúdas” das burras do seu centenário e movediço banco. Seu filho, Francisco Neto, apesar de educado na Suíça, foi menos gentil e se picou com R$ 250 mil.
         
         “PRÁ FORA A PATULÉIA!”
          No início da Era Collor, todos os bancos tiveram que encolher. Angelo optou por reengendrar uma instituição de linhagem e deu ordens para que os gerentes dispensassem a clientela menos afortunada. Um diretor chegou a verbalizar o que Olimpo queria: “Coloca prá fora a patuleia!”. Ao mesmo tempo, foi apresentado um plano mirabolante de transformar o Econômico no terceiro do país, atrás apenas do Bradesco e Itaú. O que teria dado errado?
          Angelo, quem diria, jamais imaginou que a força da sua instituição fosse a fidelidade da plebe ignara. Seu irmão Francisco, o Frank do Country Club carioca, levou para dentro do Econômico algo muito pior que a gentalha. Foi conquistado pelo discreto charme de ricaços caloteiros e começou a conceder empréstimos podres, com interesses nebulosos. Para os usineiros alagoanos, aqueles mesmos que deram início à fortuna de PC Farias e Fernando Collor, deu 50 milhões de dólares. Óbviamente, jamais cogitaram pagar.
          Ângelo, por sua vez, bozengou com dinheiro junto a uma penca de empresas micadas. A empreiteira Consic, de um cunhado seu, levou 203 milhões. O Grupo Barreto de Araújo, do inefável e vivaldino Orlando Moscoso, duas vezes vice-governador da Bahia, levou outro naco  gorduroso; Jornal do Brasil; TV Manchete; Gazeta Mercantil, todos eles pegaram seu mondrongo. Ele tentava armar sua própria ruma no xadrez do poder. No folclore do Econômico está viva a frase de Tony Mayrink Veiga, logo após ser contemplado com 14 milhões, quando perguntado de que forma pagaria o recebido: “Pagar? Esse é um detalhe de somenos importância. O nosso Frank dilui isso no balanço do Econômico.
          Os interventores do Banco Central avaliam que há cerca de R$ 1 bilhão em micos. Um deles explica que o Econômico começou a quebrar quando seu presidente passou a dar mais importância ao sobrenome dos tomadores que ao cadastro. “No Bradesco, o Tony Mayrink Veiga não teria nem direito a talão de cheques”, fulmina o interventor. No Código Penal, chama-se isso de “administração temerária”, na Bahia, de “casa da mãe-Joana”. Em vez de executar os devedores, os prejuízos foram sendo varridos para debaixo do tapete. Produziram-se balanços maquiadíssimos, capazes de encabular Michael Jackson.
          O melhor do negócio vinha na hora de distribuir os dividendos. Tudo que é banco partilha os lucros emitindo novas ações, os chamados “filhotes”. O Econômico era o único dos grandes que esguinchava dinheiro vivo. Em julho, dias antes da intervenção, o banco distribuiu a mufunfa relativa aos de R$ 36 milhões que teria lucrado no primeiro semestre de 1985, uma balela, é óbvio. Só Ângelo, que tem 40% das ações, embolsou R$ 14 milhões!!!
              Deu para entender como foi que um jovem tubarão se fez gênio financeiro para anos depois, já na condição de último dos aristocratas, cair sob churrio público?

         BARÃO MODESTO
          “Um cão danado, todos a ele”, ensina um ditado baiano. Caído, Angelo vê negadas até suas muitas qualidades. Ou será que o prezado leitor pensa que o doutor Angelo Calmon de Sá não as tem?
          O ex-banqueiro é tão chique que jamais ostentou o que possui (ou melhor, possuía). Mora em uma mansão no Morro das Mangueiras, elegantérrimo. São dois andares, cinco quartos, boate, uns mil metros de área interna e três mil de terreno. Pelos padrões do Morumbi, em São Paulo, ou do Lago Sul, em Brasília, chega a ser chinfrim. O cafufo de Tereza (filha de ACM) e de César Araújo da Matta Pires, o “A” da empreiteira OAS, tem de construção o que a mansão de Ângelo de tem terreno. A casa de veraneio do barão, na ilha de Itaparica é menor que a de qualquer vizinho.
          O casal Calmon de Sá tem um Opala e uma Caravan. A filha Aninha, até casar em abril, circulava num Gol branco com motorista. Angelo tem um boa adega de vinho, nada comparável à de Vitor Gradin, mero diretor da empreiteira Odebrechet. Tem uma boa coleção de prataria antiga, mas nem chega aos pés das toneladas dos Costa Pinto. Possui bons tapetes persas, gobelin franceses e cuzquenhos catalogados, algo de matar Gilberto Sá de vergonha.
          Angelo tem dois orgulhos. Os primeiro são as suas fazendas, com um dos melhores plantéis de nelore do mundo, acanhadas frente aos latifúndios do ex-governador Nilo Coelho, o Nilo Boi, conseguidos graças à sua forma muito peculiar de lidar com o erário. A maior diversão do magnata é pescar. Tem uma lancha, um pouco maior que a de Antônio Ermírio, é verdade, mas há pelo menos 100 embarcações ancoradas nas águas da Baia de Todos os Santos maior que a sua. Certa vez, ao vê-lo singrar, Eike Batista, marido de Luma de Oliveira, sorriu com desdém.
          Angelo era visto com frequencia atravessando madrugadas em boates de Salvador. Dançava a noite inteira, quase sempre em companhia da mulher e dos quatro pimpolhos. Sempre foi muito festejado, contudo, jamais deixou que aquele povo da Sociedade Emergente sentasse à sua mesa. Nunca consentiu convidá-los para sua casa, frequentada, exclusivamente, pelos quase 100 familiares --os mais próximos. Os novos ricos odeiam o casal, acham-nos metidos a besta. São apenas recatados. Anna Maria, por exemplo, prefere jogar bridge com as irmãs a comparecer a uma badalação social, ainda que travestida de “festa beneficiente”. Ela já foi vista escolhendo roupas com uma sobrinha na liquidação da Mesbla e, em outra ocasião, foi flagrada, sentada no chão, arrumando as gavetas da boutique de uma amiga no Shopping Barra.
  
         O CAFAJESTE E A MISS
          O playboy paulista Baby Pignatari resolveu promover uma festinha de arromba com meia dúzia de amigos e uma dúzia de quengas no Hotel da Bahia, bem no Centro de Salvador. Isso foi há mais de 30 anos mas até hoje a zorralha provoca referências ruborizadas nas rodas das madames do Clube Baiano de Tenis. Na época, o hotel era tão chique que os coronéis do cacau costumavam manter apartamentos fechados para finais-de-semana. Ex-partner de Carmen Terezinha Solbiati, hoje Senhora Mayrink Veiga, e sócio de Jorginho Guinle no Clube dos Cafajestes do Copacabana Palace, Baby Pignatari levava a fama de escroque da pior qualidade.
         Ia muito a Salvador para cuidar da sua empresa, a Caraíba Metais, à bordo de seu incrível avião, um quatrimotor Electra, PT-DZK, com cinema, bar, escritório e suíte com banheira, apelidado em Congonhas de Air Suruba. Para se ter idéia do luxo da aeronave, ela ainda voa pelos quatro cantos do mundo com seu novo dono, o reverendo Rex Humbard, o Edir Macedo dos States. Naqueles tempos o imponente Electra, tomando meio pátio do Aeroporto Dois de Julho, era uma competente provocação do playboy paulista aos engruvinhados coronéis locais, com seus ternos de linho branco e seus Simca Chambord. Um dia, em pleno Campo Grande, deu um porre em um jegue com champanhe Cristal. Pelo simples prazer de afrontar aquela doce gente morena, laçou para noiva o pitéu mais cobiçado do Pelô, a miss Bahia, Anna Maria Carvalho, moça recatada e de boa família de Feira de Santana.
          Voltemos à baconíada promovida por Pignatari no hotel. A ousadia do estróina ultrapassava os limites da malemolência baiana. Depois de muito scoth e fartas cafungadas de um rapézinho branco, por ele introduzido na vida baiana, colocou uma das periquitas sentada na sacada da suíte, núa em pêlo, com as zambetas para fora. A multidão, na praça defronte, deliriou. Baby ainda ajudou a pururuca a fazer sua performance pública. O Doutor Octávio Mangabeira, ex-ministro e ex-governador, glória da Bahia, vivia seus últimos dias morando no hotel por ele contruído, de favor. Ao ver movimentação, gritou para a mulher. “Esther, corre para ver! Enfim, o povo da Bahia reconhece o quanto fiz por ele”. E tome acenos para a multidão, cada vez maior. Doutor Octávio morreu feliz. Isso ele deve a Baby Pignatari.
           A mocinha comportada, contudo, se viu obrigada a chutar o pretendente. Mas tudo bem, comentaria mais tarde o endiabrado, com desdém. A miss era por demais jogo-duro. O escroque até consentira noivá-la e, ainda assim, ela não baixara a guarda. Não durou muito seus embalos; Baby quebrou. Logo depois a miss Anna Maria arrumaria novo pretendente, jovem rescendendo a colônia Lancaster, ambicioso e apaixonado, bem mais promissor que o primeiro, diga-se, chamado Ângelo Calmon de Sá. Tiveram quatro filhos, estudados na Suíca, e ainda hoje vivem juntos. Isso, também ele, deve a Baby Pignatari. Mas apesar de tudo, o destino da jovem miss estava traçado pelo Senhor do Bonfim. Com um ou com outro, ela seria a mulher de um milionário. Com um ou com outro, seria a mulher de um quebrado.
          Sic transit gloria mundi. Depois de se tornar parte da paisagem dos ricos e poderosos, a ponto de seu próprio nome, na Bahia, ser confundido por dinheiro, Angelo Calmon de Sá encontra-se recolhido a seus próprios pensamentos. Está percorrendo o sinuoso caminho que leva ao opróbio. Chegou a confessar -quem diria- frente às câmeras de TV, que jamais precisara de qualquer tipo de medicamento para dormir, mas que agora, mesmo tomando, não conseguia repousar tranquilo.
          O telefone toca menos que antes e nenhum dos amigos que ajudaram a enterrar o Econômico têm tempo para lhe dar um alô. A grama só não irá crescer na mansão do Morro das Mangueiras porque Anna Maria tem um bom jardineiro. Ademais, Angelo ainda toca pelo menos outros 20 lucrativos negócios. Contudo, não é mais um banqueiro. Seus bens estão indiponíveis e, suprema humilhação, não pode mais ter um talão ou assinar um cheque. Os parvenouz dessa tal Sociedade Emergente estão provando ao degredado Barão da Bahia, ultimo dos sobreviventes da velha aristocracia educada na Suíça, que sem o Econômico Angelo Calmon de Sá passou a ser um homem como as suas própria despesas. Miúdo.    

A CONSTRUÇÃO DO PERFIL

Este perfil foi escrito e publicado em 1995, na revista Interview, assim que o Banco Econômico quebrou. Estive em Salvador para apurar junto a amigos e inimigos histórias sobre o personagem. Foi lá que comprei, numa banca de jornais, o livreto "Dicionário de Baianês". Completei a apuração junto a fontes do mercado financeiro de São Paulo. O melhor desse perfil é o texto, construído com a ajuda do "Dicionário de Baianês". Em 2008 os bancos internacionais começaram a quebrar. Esse fato extraordinário torna a saga de um sem-banco mais atual do que nunca.